Palavra que cala, palavra que fala

Recentemente alguém me falou dos benefícios da palavra positiva e rechaçando a legitimidade de expressar aquilo que não vai bem.

Isso é dito com tanta frequência, que nos rouba o direito de sentir o que sentimos, de esgotar o sentimento de dor até que ele se esvaia.

E adoecemos...

Nunca estivemos tão doentes.

Nunca estivemos tão sufocados por esses sentimentos que não tem a permissão de serem pronunciadas. Afinal a palavra positiva e os remédios estão aí para nos alienar.

- O poder da palavra!

- Use o poder da palavra ao seu favor.

- Mude a sua realidade mudando aquilo que você diz…

- Mas que palavra é essa?

Palavra esvaziada de sentido, que é poderosa pela sua simples menção? Ou aquela palavra que de tanto que é repetida vira verdade. Verdade esvaziada de sentido?

Qual palavra tem o poder de nos livrar de uma angústia? Aquela que encobre um sentimento ou aquela que escancara esse sentimento.

Porque palavras nomeiam afetos, e afetos contidos arrumam um jeito de sair, escoando pela via da palavra ou pela via do sintoma.

Acho até que é possível mudar momentaneamente um estado de humor usando palavras que carreguem um otimismo, porém a angústia estará latente, pulsando para ser pronunciada, e em algum momento terá que sair. Palavra que precisa sair quantas vezes forem necessárias para esvaziar um afeto que nos oprime.

Essa palavra que tem poder de transformar algo “negativo em positivo” interessa a quem? A quem sofre ou a quem presencia o sofrimento do outro. Talvez aquele que sofre lembre o sofrimento daquele que nega.

Então o lema é:

- Vamos juntos, proferindo palavras de otimismo, fingindo juntos que isso de fato muda algo de verdade e assim ignorando aquilo que nos oprime o peito vamos adoecendo coletivamente na negação da dor escamoteada.

E viva a positividade adoecedora dos tempos atuais.

Adrilena Aguiar